No post anterior prometi um artigo sobre alguns filmes inspirados pelo 11 de setembro. Me expressei mal. Dificilmente o que eu ia escrever pode ser considerado um artigo, e nem mesmo iria falar de filmes diretamente ligados aos ataques de 2001. Eram filmes, na verdade, sobre a Guerra do Iraque. Mas já que prometi, vou soltar alguns pitacos sobre uma pequena lista de filmes sobre os ataques.
O retrato mais cru dos ataques vem de um documentário muitíssimo conhecido do grande público: 9/11, filmado por dois franceses que acompanhavam uma divisão do corpo de bombeiros de NY. A dupla é responsável por algumas das cenas mais impressionantes do evento: o colapso da torre sul filmado de dentro do lobby da torre norte (clique aqui para uma versão de sete minutos) e a única filmagem clara do impacto do primeiro avião, pra não mencionar o alto som de impacto dos "jumpers". Nada mais, nada menos do que isso: o horror sendo experimentado in loco.
Outro documentário, este o mais visto da história, é Fahrenheit 9/11, de Michael Moore. Todo mundo sabe: é um panfleto que tentou arrancar os republicanos da Casa Branca. Um belíssimo panfleto, mas mal-sucedido em seu objetivo, infelizmente. Muita gente criticou Moore por ser manipulador, mas isso não tem sentido. Com tanques midiáticos como a Fox News dando total guarida aos neocons, a manipulação de Moore foi mais do que legítima e bem-vinda. E não foi nada grave, convenhamos: uma ediçãozinha esperta aqui, outra ali, e Fahrenheit consegue um retrato bastante próximo da realidade do governo Bush. Talvez o grande pecado tenha sido mirar tanto na figura do presidente, o que acabou gerando em muita gente a sensação de tudo ser apenas uma perseguição infantil (problema parecido com o de Roger & Eu, o primeiro de Moore). E, claro, o problema mais sério é que o filme só consegue, no fundo, pregar aos convertidos.
Entre o documentário e a ficção está Flight 93, a história do quarto avião sequestrado que caiu na Pensilvânia. Embora ainda haja uma ou outra controvérsia sobre o que realmente aconteceu naquele vôo, o certo é que o filme narra a história que foi mais aceita pelo público americano (e pelo mundo): passageiros conscientes de que estavam nas mãos de um piloto suicida reagem e tentam retomar o controle do avião, que cai. É uma história que interessa imensamente à construção da memória dos ataques, da criação de mártires e dos símbolos de "um povo que não se intimida pela ameaça estrangeira", etc. O drama humano contado pelo filme é fortíssimo e tem boas chances de ser verídico: a transcrição das caixas-pretas relata sons de luta na cabine durante os segundos finais de vôo. Será interessante acompanhar o desenvolvimento da memória do 11 de setembro neste caso em particular.
World Trade Center, de Oliver Stone, é outro que relata uma história dita verídica. Dois oficiais da Autoridade Portuária sobrevivem ao colapso da torre sul e são finalmente resgatados com vida. As cenas do colapso são ótimas, mas o restante é de uma direção pouco inspirada, com o filme parecendo caminhar numa direção um tanto equivocada com flashbacks insossos que atrapalham a narrativa. As melhores partes ficam por conta de Nicolas Cage, que salva o filme mesmo ficando o tempo todo debaixo dos escombros. O teor ideológico se mostra quando entra em cena a figura de um misterioso mariner que tem uma revelação diretamente enviada pelo Senhor, vai até Nova York com uma lanterninha na mão e entra no meio da montanha de concreto e aço retorcido à noite para achar os dois sobreviventes. Mariners, os anjos voluntários que vão salvar e proteger o país, ho ho ho, feliz natal. Quase tão inverossímil quanto sobreviver ao colapso pulando no fosso do elevador. (Ok, há informações de que umas 20 pessoas sobreviveram ao colapso das torres).
Há ainda filmes menos conhecidos, como os documentários The Falling Man e Loose Change (os links levam às versões completas dos filmes no Youtube). Falling Man é um belíssimo ensaio cujo ponto de partida é uma sequência de fotos da queda de um dos mais de 200 "jumpers", pessoas que pularam ou cairam do alto das torres. O filme busca identificar o jumper e analisa a reação das pessoas ao horror particular dessas vítimas do 9/11. Documentário sério e bem feito, ao contrário de Loose Change, uma compilação de teorias conspiratórias sem nexo, a começar pela teoria da demolição controlada - segundo essa explicação para o colapso das torres, o governo norte-americano teria implodido os edifícios. É interessante assistir esse documentário para ter uma idéia do quanto o 11 de setembro mexe com os dois lados da histeria norte-americana: de um lado, o evento deu vazão a um recrudescimento da xenofobia entre os conservadores e uma clara justificativa para os republicanos desdenharem da ONU e mobilizarem a maior máquina bélica já construída pelo homem; de outro, a falta de explicações definitivas sobre os detalhes mais difíceis do episódio (como: por que os aviões não foram abatidos? por que realmente as torres colapsaram?) abriram caminho para que os esquerdóides lunáticos de lá e o grande número de "libertários" que vêem o estado como inimigo elaborassem as mais tresloucadas teorias conspiratórias responsabilizando a administração Bush pelas mais de 3000 mortes daquele dia. O fato de que provavelmente muitas pessoas no Pentágono e na Casa Branca estivessem brindando a tragédia que lhes daria carta-branca não significa que os ataques foram um "inside job", uma coisa de autoria do governo. Noam Chomsky, aliás, pode defender muito melhor do que eu esse ponto de vista (aqui e aqui). Este é mais um dos aspectos do 11 de setembro cuja construção da memória será interessante acompanhar nos próximos anos.
Por fim, um filme que foi lançado em 11 de setembro de 2002, 11´09"01 e que fica aqui como dica pra você e pra mim, já que ainda não o assisti. Uma vergonha, já que Sean Penn e Iñarritu assinam dois dos curtos episódios que contêm 11 minutos, 9 segundos e 1 quadro. Mas vai pra lista de downloads agora. Se você já viu, me diga o que achou.
O próximo post vai abordar alguns filmes sobre a Guerra do Iraque. Filmes melhores, muito melhores.
4 comentários:
Michel Moore me diverte. Adorei Fahrenheit. Ri muito também - pois os absurdos são tragicômicos - mesmo tratando-se de um evento delicado...
Quanto ao Vôo 93, não gostei nada, nada. O estilo das tomadas de câmera, assim como as montagens das cenas não me agradaram. Razoável, somente.
Já WTC de Oliver Stone é fraquíssimo. Possui uma narrativa demais de convencional. Sem dizer o lance de heroificação - que me causa ânsia de vômito. Fora outros elementos consideravelmente toscos.
As cenas físicas do desabamento são bem feitas. Pudera.
Não chega a ser medíocre mas é dispensabilíssimo, na minha opinião.
Um bom filme que faltou na sua lista foi "The Hamburg Cell", dirigido por Antônia Bird - Fiquei sabendo de nome e direção agorinha, tudo via youtube/google, e através de muito garimpo. Só não sei se tem tradução.
Mas achei um ótimo filme.
Quanto ao resto não posso opinar, somente assistindo. Mas espero que seja em breve...Né, magruxo?
Putz, Van, esqueci que você já tinha me falado sobre esse aí. Pra lista de downloads também já!
Ok, o dos episódios e a "célula de hamburguer" nós assistimos ainda essa semana.
O Episódio de Sean Pean é belíssimo. De uma singeleza e sensibilidade ímpar. Vale o pacote, que é razoável em seu conjunto.
UM Abraço
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