23 de maio de 2008

Sinédoque

Seymour Hoffman é o mais novo perturbado pelo desprezo feminino, em Synecdoche, de Kaufman


Um dos primeiros posts deste blog, há mais de um ano, transbordava ansiedade com o anúncio das filmagens do primeiro filme dirigido por Charlie Kaufman (o roteirista de Brilho eterno de uma mente sem lembranças, Adaptação, Quero ser John Malkovich, Natureza humana, Confissões de uma mente perigosa).

A espera está acabando. Synecdoche, New York estreou em Cannes, hoje. Diz a matéria da France Presse:

O filme tem como personagem central Caden Cotard, diretor teatral insatisfeito com sua criação artística e que tem seu relacionamento com uma artista plástica em crise.

Hipocondríaco e obsessivo com o medo da morte, abandonado pela mulher, que leva a filha, Caden decide, após receber uma grande quantia de estímulo à arte, realizar uma enorme obra teatral, uma obra total que seja a representação da sua vida.

Mais que uma história contada e linear, o filme de Kaufman é uma construção labiríntica através da qual o diretor aborda temas de sua preferência, já usados em roteiros anteriores: limites entre realidade e imaginação, criação, a percepção do outro, mas também o envelhecimento e o medo da morte.

Em entrevista no Hollywood Reporter, Kaufman voltou a esclarecer o ponto de Synecdoche:

In a general way, it's about the experience of going through life, and heading toward the end of it. The movie follows this character for 40 years, and it's about people's losses and death and fear of death and intimacy and relationships. Romance and regret and struggle and ego and jealousy and confusion and loneliness and sex and loss -- all those things are in the movie. I wanted it to be an all-inclusive experience of a person's life. It's this guy's world.


E na Variety, uma ótima matéria com um pouco da história de Kaufman e de Synecdoche. Nela, ficamos sabendo que o diretor de teatro interpretado por Phillip Seymour Hoffman é deixado por sua mulher, que não admira seus trabalhos. Para provar algo a si mesmo, constrói uma peça tão grande quanto a vida.

Não deixa de ser engraçado que o trabalho do titereiro de John Malkovich tenha sido incompreendido e desprezado tanto por sua mulher, quanto por Maxine - seu verdadeiro tesão - ou que as pesquisas do cientista de Natureza Humana tenham sido subestimadas por sua esposa, e falsamente valorizadas por uma vagabunda em busca de ascensão profissional.

Tomara que Charlie nunca encontre uma mulher que babe ovos sobre seus filmes. E devemos agradecer à(s) fêmea(s) anônima(s) que tanto desprezaram os trabalhos do cara. Sem ela(s), não se produziriam todas essas obras-primas.

Um comentário:

Vanessa disse...

Se dependesse de mim...o homem não produziria nada. Amo o trabalho dele!

Bem que minha vovozinha sempre me dizia: "Por trás de um grande homem há sempre uma grande mulher"
(Adoro essas frases de efeito)

Seja para o "bem" ou para o "mal", elas sempre estão por trás...(E não o inverso. Pelo menos não nessa situação)
Da faceta destruída por outrem sempre acaba surgindo coisas absurdas de boas, depende única e exclusivamente da pessoa que lida com o dito "problema" (não havendo de ser necessariamente um problema)
Isso faz me lembrar de Woody Allen, em "Melinda e Melinda" que discute se a existência humana é trágica ou cômica...A opção é somente nossa, sua, dele, dela, deles, daqueles...

Kaufman deve saber - não é possível - que ele está nos "melhores dos mundos".

De onde você vem?