31 de maio de 2007

O Novo Volante

Deu na Folha Online: Corinthians apresenta novo volante. Abaixo, a foto do craque.

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Eu perco o orgulho futebolístico mas não perco a piada...


Post dedicado aos ilustres leitores Daniel K., Joãozinho Jocoso, Juliano, Sasqua e Saulo, entre outros milhões de tontos.

"Criacionismo o C#$*&¨%"

Por favor, acessem o blog do Sasqua e vejam essa magnífica imagem.

Não descarto a intenção do fotógrafo em captar algo de humano nos gorilas. Atualmente, existe uma forte tendência a humanizar os animais. Todo slogan é perigoso e imobiliza nossas questões sobre a realidade. Mas também acho inegável que somos tão especiais quanto os gorilas, os cachorros e as pulgas. E pelo simples motivo de que somos resultado de um mesmo processo, que Darwin intuiu e teorizou faz tempo.

Rascunho de uma idéia ocasional sobre ciência e poder

Estava eu lendo uma matéria de Ricardo Bonalume Neto, da Folha Online, sobre uma descoberta matemática realizada por um “excêntrico”, em suas palavras. E me deparei com essa passagem:

“Mas não foi esse o único fato que demonstrou mais uma vez como a ciência é uma atividade humana, sujeita aos mesmos caprichos de outras, como o esporte, a política ou a arte.”

Por “caprichos”, entende-se picuinhas, ciumeira, briga por espaço nos holofotes, rasteiras desleais e sacanagens das bravas. A conhecida disputa pelo poder. Mas não só isso: a frase quer dizer, mais profundamente, que “relações de força” estão em curso, que representações da realidade digladiam-se ferozmente numa arena que nunca é neutra.

Que a ciência está sujeita a esses caprichos, trata-se de um lugar comum, hoje. É lugar comum até mesmo em jornais e revistas, material de divulgação e livros didáticos. Já era lugar comum no meio acadêmico ontem. Anteontem, era uma concepção “nova”. Trata-se de um axioma de nossa época. Não dá pra escapar. Mas...

Não parece haver muita precisão nesse discurso. “Mesmos caprichos”, como saber se são realmente os mesmos? Os tais “caprichos” estão infiltrados no mesmo nível em práticas tão díspares? Não há “caprichos” diferentes para práticas diferentes?

Mais claramente: as “relações de força” ocorrem da mesma maneira e em mesmo grau tanto na ciência quanto em todas as outras atividades humanas? Acho que a pergunta, feita dessa forma, impele qualquer acadêmico esperto a perceber que é preciso analisar com muito critério as diferentes formas de manifestação do jogo do poder e das relações de força. Mas não é isso que ocorre! Não é isso o que eu ouço quando esses axiomas pós-modernos são jogados em meus ouvidos! (Um outro é aquele do “a ciência é uma prática mundana como qualquer outra e não possui um status epistemológico privilegiado”).

Então sobra mesmo esse lugar comum. O que tem uma implicação: se todas as atividades humanas estão sujeitas à disputa de poder, às relações de força, de maneira e nível semelhantes, então há uma “teoria universal do poder e das forças humanas”, ainda que não totalmente presente como uma verdadeira teoria. Portanto, essa gente que condena a busca da ciência por proposições universais ou gerais acerca da natureza como mera fantasia ou ingenuidade está, no mínimo, praticando a incoerência ao apelar para o axioma do jogo do poder.

30 de maio de 2007

Partes íntimas

Abaixo, uma autorização de viagem que não terminou nunca...

clique para ampliar

Rua Cinza

A música Grey Street, da Dave Matthews Band, tem uma das melhores letras sobre a anestesia e a angústia que, por vezes, tomam conta das nossas vidas. Sentimos, em vez do vermelho sangue, gelo azul correndo pelas veias. Vemo-nos cinzas, insossos, sem nada para dizer ao mundo, respirando por respirar, vivendo para morrer. Por quê não usarmos cores fortes e brilhantes para voltar a sentir a euforia, a louca euforia da vida?

There's a loneliness inside her
And she'd do anything to fill it in
And though it's red blood
Bleeding from her now
It feels like cold blue ice in her heart
She feels like kicking out all the windows
And setting fire to this life
She would change everything
About her
Using colors bold and bright
But all the colors mix together
To grey
And it breaks her heart


Sean and Pat O'Reilly fizeram um arranjo interessantíssimo para Grey Street. Violão e piano, duas vozes. Quase tão boa quanto a original. Vale a pena.


28 de maio de 2007

O direitóide

O direitóide e babão Reinaldo Azevedo


"Reinaldo Azevedo é um filho da puta", afirmou, certa vez, um sincero jornalista. Parafraseando-o, comentei que Azevedo era um tonto que escrevia na Veja, para outros tontos. Basta uma olhada no blog do "Rei" (como é chamado por seus fãs) para perceber o quanto isso é verdadeiro.

Por lá, encontramos as asneiras direitóides de praxe: Che foi um assassino cruel, Chávez é um ditador, Lula é um apedeuta, a Folha de São Paulo é um jornal esquerdista, etc. Seu principal alvo, atualmente, é o movimento estudantil da USP. É o seu atual pretexto para soltar o verbo da direita raivosa.

Até aí, tudo bem. Se existe Diogo Mainardi, por quê não Reinaldo Azevedo? Pelo menos, o último parece ter uma formação intelectual decente e é muito menos simplista. O tipo de voz direitóide que representam ganhou um pouco mais de destaque nos últimos anos graças à subida do PT, ou "lulo-petismo", ao poder. À moda de Olavo de Carvalho, constróem seus discursos à base de muita raiva e agressividade. Imitam o velho astrólogo pedinte também na exibição de uma postura de inconformismo e protesto contra um establishment esquerdista ilusório. Estão loucos, babando.

O melhor de tudo é quando percebemos que, por trás da carapaça do inconformismo, escondem-se pelegos cósmicos. No caso de Reinaldo Azevedo, a peleguice e o conformismo revelaram-se através de um texto em que ataca o "antiamericanismo" mundial após a ocupação do Iraque.

Basicamente, Azevedo reconhece que a premissa fundamental da guerra foi uma invenção dos falcões do Pentágono. Reprova o horror da guerra. Condena-a como imoral. Diz ser a pessoa mais delicada quando o assunto é matar uma mísera barata. Mas aceita a guerra do Iraque. Reinaldo Azevedo aceita uma guerra imoral e seus milhares de mortos. E, pior, critica e desqualifica quem não a aceitou e protestou mundo afora.

O que parece incoerente tem a maior das coerências. O argumento é muito lógico. Baseia-se no direito do exercício do poder. Azevedo cita Gibbon, um historiador do século XVIII, para chegar à conclusão de que os impérios devem exercer o seu poder, irrestritamente, afim de levar suas benesses civilizatórias aos bárbaros.

Que os impérios exercerão seu poder, não há dúvidas. E Reinaldo Azevedo não é o primeiro a usar o argumento da força. Durante a guerra do Peloponeso, Atenas massacrou os habitantes da colônia espartana de Milo. Segundo Tucídides, num encontro anterior entre representantes mélios e atenienses, os últimos lançaram uma simples justificativa para sua postura imperialista. "Deveis saber, tanto quanto nós," disseram os atenienses, "que o justo, nas discussões entre os homens só prevalece quando os interesses de ambos os lados são compatíveis, e que os fortes exercem o poder e os fracos se submetem. [...] Em nosso caso, não impusemos esta lei nem fomos os primeiros a aplicar seus preceitos; encontramo-la vigente e ela vigorará para sempre depois de nós; pomo-la em prática, então, convencidos de que vós e os outros, se detentores da mesma força nossa, agirieis da mesma forma."

Depois de constatar, como os atenienses, a lei do mais forte, Azevedo lança uma questão: "uma nação que se negasse a pressionar Kruchev com o fim do mundo, na chamada crise dos mísseis cubanos, ou que se abstivesse de impor sua vontade a Bagdá teria feito o primeiro transplante de coração ou reproduzido, desta feita no éter, as grandes navegações do século XVI?" É óbvio que as conquistas da ciência e da tecnologia estão no mesmo contexto sócio-cultural das conquistas militares. Ambos os campos influenciam-se mutuamente. Seria ingênuo achar que não. Porém, mais ingênuo ainda é Azevedo, que enxerga entre elas uma simplista relação de causalidade necessária. Os norte-americanos podem empurrar sua agenda para acelerar a ida do homem a Marte ou continuar gastando bilhões de dólares no trabalho de mandar seus filhos para morrer e matar pessoas do outro lado do mundo. O jipe Spirit não está, neste exato momento, analisando minérios marcianos por que os Estados Unidos são um império que bombardeou muitos países e matou muita gente.

No caso grego, Atenas, além de centro difusor do pensamento, era também uma potência militar imperialista. Mas, e Esparta? Me desculpe, mas não há notícias de que algo minimamente próximo à produção de conhecimento ateniense tenha existido em Esparta. No entanto, quem ganhou a Guerra do Peloponeso? Não é difícil achar, na história, potências militares que não brilharam tanto quando o assunto era a produção de conhecimento e aprimoramento tecnológico.

Os Estados Unidos exerceram seu poder com justificativas falsas e mergulharam um país no caos de uma guerra civil fratricida. Devemos aceitar passivamente, sem protestos, que tal coisa aconteça? É imoral sentar e apenas constatar que uma lei natural está sendo cumprida.

Reinaldo Azevedo orgulha-se de sua lógica. Tem toda a razão. É uma lógica primorosa. E primorosamente cruel. Hitler saudaria com o braço em riste este inofensivo senhor de chapéu e óculos.

Eletrizante

Abaixo, o GP de Mônaco de F1, em três momentos.


A largada de tirar o fôlego!


Ultrapassagens alucinantes!


E a eletrizante chegada!

27 de maio de 2007

É só impressão

Pergunta: "Impressão minha ou você realmente gosta do Senna muito menos do que eu?"

É só impressão.

Senna foi o herói da minha infância. Ainda é um herói. Eu o adorava, como adoro a obra que deixou. No entanto, isso não impede que eu o enxergue com olhos distantes e use de bom humor no comentário sobre o que me é estranho nele.

Senna era passível de cometer besteiras, mais do que Prost e Schumacher. Mas era um artista genial dentro de um carro de F1. As besteiras intensificaram seus brilhos - elas transparecem a humanidade do herói. Uma cagada como a de Mônaco, em 88, revela o fio da navalha em que Ayrton andava. Estava 52 segundos à frente de um dos maiores pilotos que já sentaram num F1. E os dois tinham o mesmíssimo carro.

Os que seguem fielmente as raias da segurança e da certeza não fazem muita besteira. Mas também não deixam memórias tão fortes quanto aqueles que arriscam, que vão além e desenvolvem estilos belos e únicos.

Senna me inspira, até hoje. Seu exemplo é um chamado para os riscos necessários a quem quer buscar mais, cada vez mais, incessantemente.


Edit 17h: Não que tenha lá muita importância, mas não fui claro numa questão. Não gosto de montar hierarquias sobre os seres humanos. Mas, se tivesse que escolher um piloto, escolheria Senna. Dos que vi correr (assisto F1 desde 86/87), Senna é o melhor. É muito melhor do que Prost e Piquet, e melhor do que Schumacher em muitos aspectos (no mais importante, principalmente: rapidez). O limite pra se dizer que foi o melhor de todos é a impossibilidade de compará-lo com pilotos de eras anteriores tão distintas. Gente como Fangio, Clark e Stewart ficam de fora da comparação, portanto.

25 de maio de 2007

Deus e o MP4/4


Viviane Senna está em Mônaco para acompanhar a corrida de GP2, amanhã. Seu filho, Bruno, está em segundo lugar na classificação geral da categoria de acesso à F1. Hoje, os dois participaram de homenagens a Ayrton, com a presença do príncipe Albert, que só serve pra essas coisas.

A foto acima é meio estranha. Se havia lá mais carros guiados por Senna, a escolha de Viviane foi estranha. Se não havia, estranha foi a organização do evento. Esse carro é o McLaren MP4/4 - a parte traseira mais baixa típica do motor turbo e o número 12 não mentem.

O MP4/4 foi um dos carros mais vencedores da história da F1. Com ele, Senna e Prost venceram 15 das 16 corridas da temporada de 88. Sim, Senna é o senhor de Mônaco, com seis vitórias, mas quem venceu por lá com esse carro foi Prost. O baixinho narigudo estava 52 segundos atrás (isso mesmo, 52s, com o mesmo carro) quando Senna fez uma das maiores cagadas de sua carreira. Perdeu a concentração a duas voltas do fim e enfiou o imbatível MP4/4 no guard-rail da Portier.

Enfim. Viviane pode ter escolhido esse carro porque foi o do primeiro título do irmão, ou porque foi a bordo dele que Senna disse ter visto o Todo-Poderoso Criador do Universo, no Japão. O fato de que os outros 25 pilotos não o viram, tampouco os milhares de torcedores, nunca demoveu Senna de sua "visão". Ele dizia que o acidente de Mônaco o tinha transformado espiritualmente. Talvez seja essa a causa da estranha foto.

Por último, você pode estar se perguntando, por quê diabos o MP4/4 não ganhou as 16 provas de 88? Porque em Monza, Senna deve ter tido uma de suas visões cósmicas enquanto atropelava aquela Williams do Schlesser, que se arrastava na chicane. Faltavam, também, duas voltas. E quem acabou tendo a epifania foram os tiffosi, que viram uma dobradinha cair no colo da Ferrari.

Isto é Monte Carlo


Sem comentários...

Automóvel in natura

O vídeo do post anterior foi achado no Blog do Gomes. E, como não poderia deixar de ser, Flávio Gomes mescla natureza e sua paixão por Ladas para criar um post hilário.

Diz Gomes, por lá:

SÃO PAULO (nocaute) - Nas ruas de Budapeste foi travado o embate final entre essas trapizongas com cara de Pokémon e a gloriosa indústria soviética.

Nem preciso dizer o que deu.

Estado de natureza

A luta pela existência, nua e crua. Sem as narrativas antropomórficas do National Geographic ou do Discovery Channel, apenas a reação espantada de humanos.

Aliás, é interessante pensar na posição dos nossos semelhantes nesse vídeo. São espectadores. Imagino serem europeus. Viajaram de avião para a África. Chegaram à cena em rovers. Captaram tudo com uma câmera digital. Depois, empolgados, contaram tudo aos seus entes queridos, outros humanos, via celulares GSM. Por fim, rodaram o video ao redor do mundo pela internet. E voltaram à vida normal.

Nossa posição é muito confortável. Estamos envoltos numa bolha, numa verdadeira Matrix, que impede a maioria mais conformada de nós de enxergar a realidade. Há uns 80 mil anos, estávamos no meio dessa luta feroz pela existência. Vimos muitos de nossos filhotes serem trucidados. Sentimos o desespero da presa e o prazer do predador. Somos produto dessa pulsação cruel da vida.

24 de maio de 2007

Low-tech Tetris

Tem sido difícil pensar, hoje.

Então lá vai nonsense pra cascar o bico!

She burns like the sun...

Se tem uma paixão que não escondo é pela banda Muse. E a musa vem, desde 1999, destilando seus encantos. O primeiro deles - a primeira música do primeiro disco - é Sunburn.

Quer conhecer? Cá está o clipe.



O video é, em si, uma obra à parte.

A protagonista tem uma vida mais ou menos estável e tediosa. Passa o tempo em frente à tela cintilante da TV, vivendo uma vida que não é dela. Porém, quando se retira para encarar sua própria alma, vê que não está só. No espelho, uma figura vampiresca lhe faz companhia, a perturba com idéias impensáveis, que ela gostaria de evitar mas não pode. Ela cora, se descontrola. Então, por defesa, quebra o espelho.

O que é melhor? Quebrar o espelho ou tentar encará-lo, por mais perigos que ele possa oferecer?

23 de maio de 2007

Milan 2, Liverpool 1


O Milan calou o nojento Gerrard, até meio injustamente. No primeiro tempo, o Liverpool engoliu os rossoneri, mas tomou um gancho no queixo e não foi mais o mesmo.

Duro foi ver a camisa do Kaká: "I belong to Jesus". Mas tudo bem. Espera-se que ele faça gols e dê passes magistrais, como o de hoje. Não que pense.

É hoje!

Pra quem gosta de ver jogos de futebol no estádio. Sinta a loucura das torcidas. Sem narrações querendo nos empurrar emoção goela abaixo.



Os ingleses riram por último em 2005. Hoje, dá Milan. 2 a 0, Kaká e Seedorf.

Times da série A, tremei!


Volto do Majestoso com uma vitória de 2 a 0 sobre o Fortaleza, ex-líder da série B.

Quem é o líder agora?

Quem vocês acham que ponteia essa droga de competição?

Em três pulos, a Macaca chegou ao galho mais alto!

Pelo menos até sexta-feira...

22 de maio de 2007

Poesia e morte, ontem e hoje

A morte em dois momentos.

Primeiro, por Christian Hofmann von Hofmannswaldau, poeta do século XVII. Poesia citada em A Solidão dos Moribundos, do sociólogo Norbert Elias.

Transitoriedade da beleza

Por fim a morte pálida com sua mão gelada
Com o tempo acariciará teus seios;
O belo coral de teus lábios empalidecerá
A neve de teus mornos ombros será fria areia
O doce piscar de teus olhos / o vigor de tua mão
Por quem caem / cedo desaparecerão
Teu cabelo / que agora tem o tom do ouro
Os anos farão cair, uma comum madeixa
Teu bem formado pé / a graça de teus movimentos
Serão em parte pó / em parte nada e vazio.
Então ninguém mais cultuará teu esplendor agora divino
Isso e mais que isso por fim terá passado
Só teu coração todo o tempo durará
Porque de diamante o fez a Natureza

Preocupado com as diferenças históricas relacionadas à abordagem da morte, Elias comenta:

"Falta aqui o tom solene ou sentimental mais tarde muitas vezes associado à lembrança da morte e da sepultura. [...] As pessoas do círculo do poeta deve ter se divertido com uma brincadeira que facilmente escapa a um leitor moderno. Hofmannswaldau diz à sua relutante amada que sua beleza desaparecerá na sepultura, seus lábios de coral, seus ombros de neve, seus olhos insinuantes, todo seu corpo decairá - exceto seu coração: ele é duro como diamante, pois ela não dá ouvidos a seus apelos. No registro dos sentimentos contemporâneos dificilmente encontraremos qualquer coisa que corresponda a essa mistura de funéreo e irreverente, essa descrição detalhada da decomposição humana como manobra de sedução."

Agora, a música Gravedigger, de Dave Matthews.

Cyrus Jones 1810 - 1913
Made his great grandchildren believe
You could live to 103
103 is forever when you’re just a little kid
So, Cyrus Jones lived forever

Gravedigger
When you dig my grave
Could you make it shallow
So that I can feel the rain

Muriel Stonewall 1903 - 1954
She lost both of her babies in the second great war
Now, you should never have to watch as your only children are lowered in the ground
I mean, you should never have to bury your own babies

Gravedigger
When you dig my grave
Could you make it shallow
So that I can feel the rain

Ring around the rosey
Pocket full of posey
Ashes to ashes
We all fall down

Gravedigger
When you dig my grave
Could you make it shallow
So that I can feel the rain

Little Mikey Carson '67 - '75
He rode his bike like the devil until the day he died
When he grows up he wants to be Mr. Vertigo on the flying trapeze
Oh, 1940 - 1992

Gravedigger
When you dig my grave
could you make it shallow
So that I can feel the rain

Duas atitudes perante a morte. A primeira a trata com naturalidade e irreverência. A segunda, com o peso e dramaticidade dignas da maior tragédia que pode nos abater. Sinal dos tempos. Há apenas alguns séculos, a morte presente em todos os lugares, a todo momento. Hoje, o distanciamento cada vez maior do fim. "Nunca antes na história da humanidade", afirma Elias, "foram os moribundos afastados de maneira tão asséptica para os bastidores da vida social; nunca antes os cadáveres humanos foram enviados de maneira tão inodora e com tal perfeição técnica do leito de morte à sepultura".

"Você não deveria enterrar suas crianças", diz Matthews, sobre a mãe que perdeu seus dois filhos na Segunda Guerra. Hoje, pelos menos nos países desenvolvidos, as guerras viraram exceção. E a morte dos filhos, antes dos pais, especialmente na infância, é vista como algo anti-natural. Esquecemos que, durante a maior parte da história da nossa espécie, vimos grande parte de nossas frágeis crianças serem varridas pelo destino. Somente no nosso tempo, com todas as precauções tomadas contra a morte, podemos nos dar conta da infinita tragédia de uma lápide como "Michael Carson 1967 - 1975".

Aliás, é sobre o "Little Mikey Carson" que surge a melhor parte da poesia de Dave Matthews. Em vez de falar no passado, coloca os desejos do pequeno Carson no presente: "quando ele crescer, quer ser o Mr. Vertigo no trapézio voador". E, como que para lembrar a inevitabilidade da morte de tudo e de todos, incluindo a do próprio menino, fecha o verso: "Oh, 1940 - 1992". Até os heróis, Mr. Vertigo, Carl Sagan, Ayrton Senna, morrem.

A morte, um tema freqüente nas composições de Dave Matthews, é encarada por muitos de nós, hoje, com terror e ansiedade. A maioria ainda corre, apavorada, para as colinas da religião. Os que ficam no pântano da realidade sofrem a tragédia. É disso que nascem a arte mais profunda e o questionamento filosófico mais intrigante.

Solitário Spirit

Calma, Spirit. Um dia, talvez, você encontrará um sentido...


Seguindo na trilha das últimas descobertas sobre Marte, o robô Spirit encontrou, por acaso, fortes evidências de água na cratera Gusev, seu habitat desde que chegou ao planeta vermelho.

Como reporta a Folha, Steve Squyres, um dos líderes da missão que levou dois jipes a Marte em 2004, relatou que "você podia ouvir as pessoas arfando de espanto" com os dados enviados pelo Spirit.

Ah, a sensação de descoberta...

Squyres já falou, também, muito sobre a maneira com que os cientistas estão lidando com inevitável "morte" do Spirit e do Opportunity. Mas isso fica pra outro dia. Por enquanto, fiquem com um site especial das explorações do Spirit.

Créditos da imagem: Caco Galhardo, Folha de São Paulo, 15/05/2007.

21 de maio de 2007

O Juízo Final



À esquerda: painel central de O Juízo Final, de Bosch.

Dias atrás, fui importunado na tranqüilidade virtual de meu Orkut por uma série de questões colocadas "para pensar". Sempre preocupado com a questão do conhecimento humano, Juliano Stefanovitz perguntava: "o que o meu tatatataraneto vai aprender, em 2312, sobre esse nosso tempo (sécs. XX, XXI)? Quais serão consideradas as grandes contribuições de nossa época ao pensamento humano?"

Como já disse ao meu amigo, e ele mesmo sabe disso, essas questões estão obviamente fadadas a ficar sem respostas. Qualquer tentativa no sentido de respondê-las que não apele para a ficção soaria ridícula. É claro, poder-se-ia objetar que, sim, temos elementos para tentar imaginar o que o século 24 pensaria do nosso tempo. Afinal, só para ficarmos nas ciências naturais, conhecemos o impacto que tiveram a relatividade, a física quântica e a genética, por exemplo. Todo mundo está careca de saber que, em nosso tempo, inventamos a bomba atômica, fomos à Lua, colocamos telescópios e estações espaciais em órbita, sondamos os recônditos do sistema solar. Porém, o problema é mais profundo.

O tormento de meu amigo explica-se quando recebo sua segunda mensagem. "Há o Iluminismo, o Renascimento, há vários períodos que ganharam destaque pela contribuição que deram à evolução da humanidade." Aí está o cerne de suas preocupações: seremos, para o século 24, o que os iluministas o são para nós? Ou seremos uma Idade Média? Qual será o juízo feito sobre nós, no século 24?

Com a noção de nossa historicidade, tornamo-nos essas pessoas conscientes, como diz Antonio Candido, de que "acabam desaparecendo como indivíduos para se dissolverem nas características gerais de sua época". Se combinarmos isso com a idéia de evolução da humanidade, ou seja, a sensação de que a humanidade caminha rumo ao progresso inexorável, então temos um problema sério. Com essa visão da história, tendemos a glorificar aquilo que nos parece ter contribuído para nossa atual posição, o topo - daí a menção de Juliano ao Iluminismo e à Renascença. Essa visão também garante, porém, que estamos momentaneamente no topo: outros virão, mais desenvolvidos, mais evoluídos. Como o nosso tempo será julgado por eles?

Para um historiador familiarizado com a recente demolição infligida à idéia de progresso, essas preocupações não fazem sentido. O progresso é uma idéia ambígua, e ambíguas são muitas de nossas conquistas científicas. Vivemos melhor, mas matamos melhor. Em certo sentido, simplesmente não há um topo.

Não sabemos nada, não podemos ter a menor idéia, do olhar que nos será dedicado pelos historiadores do futuro. Não sabemos quem vai dirigir esse olhar a nós. A única coisa que podemos dar por certo é que o sentido que atribuirão ao nosso tempo interessará a eles, não a nós.

Devemos nos preocupar seriamente com essa forma secularizada de Juízo Final?

Pálido Iraque, pálida América

Lembram-se do post sobre o Pálido Ponto Azul, de Carl Sagan? Não poderia deixar de repetir esse trecho:

Pensem nos rios de sangue derramados por todos os generais e imperadores para que, na glória do triunfo, pudessem ser os senhores momentâneos de uma fração desse ponto. Pensem nas crueldades infinitas cometidas pelos habitantes de um canto desse pixel contra os habitantes mal distinguíveis de algum outro canto, em seus freqüentes conflitos, em sua ânsia de recíproca destruição, em seus ódios ardentes.

Como lhes parece, agora, as idéias dos neoconservadores de Washington e dos fundamentalistas islâmicos, o 11 de setembro e o fatricídio entre sunitas e xiitas?

Eu moro em Bagdá

Faz um certo tempo, eu estava navegando pelo YouTube à procura de vídeos sobre a Guerra do Iraque quando me deparei com Hometown Baghdad. Trata-se de mini-documentários sobre o cotidiano de alguns jovens moradores de Bagdá.

Lembro-me de ter assistido a alguns vídeos, e de ter ficado profundamente comovido com a situação dessas pessoas. Para um jovem brasileiro, é como se ver no espelho, só que numa condição apavorante. Saif, Adel e Ausama tocam guitarra, ficam horas na frente do computador, assistem futebol na TV, estudam. Em meio à carnificina.

Saif lamenta, ao violão, a ausência da namorada. Vemos um poster do Real Madrid, Roberto Carlos em destaque, no quarto de Adel. Falta energia elétrica constantemente. Ao som de tiros, muitos tiros. Ausama até pensa saber distinguir um tiro de sniper, em meio à cacofonia.

Ao que parece, Hometown Baghdad está ganhando os jornais do mundo. Deu no LA Times, no inglês The Times e, agora, na Folha (via BBC). Só não vai sair na Fox News...

E, last but not least, são mais de 60000 (sessenta mil) civis mortos no Iraque. Fora os 3400 norte-americanos. Os neo-cons devem estar radiantes.

20 de maio de 2007

O Anjo da História


Juliano Pavanelli Stefanovitz tem algumas inquietações acerca de seu lugar e, mais profundamente, de nosso lugar naquilo que chamamos de história. Sem a certeza de Fidel Castro de que "a História o absolverá", o que atormenta Juliano é: como seremos julgados pelo futuro?

Escrevo sobre isso amanhã. Hoje, quem fala é Walter Benjamin.

Há um quadro de Klee que se chama Angelus Novus. Representa um anjo que parece querer afastar-se de algo que ele encara fixamente. Seus olhos estão escancarados, sua boca dilatada, suas asas abertas. O anjo da história deve ter esse aspecto. Seu rosto está dirigido para o passado. Onde nós vemos uma cadeia de acontecimentos, ele vê uma catástrofe única, que acumula incansavelmente ruína sobre ruína e as dispersa a nossos pés. Ele gostaria de deter-se para acordar os mortos e juntar os fragmentos. Mas uma tempestade sopra do paraíso e prende-se em suas asas com tanta força que ele não pode mais fechá-las. Essa tempestade o impele irresistivelmente para o futuro, ao qual ele vira as costas, enquanto o amontoado de ruínas cresce até o céu. Essa tempestade é o que chamamos progresso.

19 de maio de 2007

Ah, o futebol...

Na quarta-feira, dia 23 de maio, ocorrerá a grande final da Champions League 06-07, entre Milan e Liverpool. O palco será o Estádio Olímpico de Atenas. É o jogo mais esperado do ano. É a revanche de uma das finais mais espetaculares da história, a batalha de Istambul, de 2005. Este ano, nem Silvio Berlusconi me impede de torcer pro Milan.

Quer relembrar o 3 a 3 de 2005? Kaká já jogava essa mesma bola de hoje e destruiu a defesa do Liverpool com dois belos passes. Mas Shevchenko perdeu o gol mais feito de sua vida nos últimos minutos da prorrogação, além do último pênalti.


Além dessa, a Champions League produziu outras finais que demonstram como o futebol, às vezes, pode rivalizar com outras artes em matéria de drama, como o teatro e o cinema.

A do ano passado, por exemplo. Stade de France, aquele mesmo, dos 3 a 0 de 98. O Arsenal segurava uma vitória heróica, com dez em campo. Lehmann foi expulso no primeiro tempo, ainda. Chovia. Ronaldinho não conseguia jogar, apesar daquela Liga ter sido inteirinha dele. Então apareceram a calma e habilidade de Eto´o, e a redenção de Beletti. Torci pelo Barça como se estivesse torcendo pra Ponte.


E a mais dramática de todas as finais. A atordoante e injusta virada do Manchester United sobre um seguro e eficiente Bayern de Munique, no Camp Nou. A segurança e a eficiência de Effenberg, Basler, Kahn e cia. duraram todos os 90 minutos. Menos nos poucos minutos de acréscimo. Ao ver a cara do Beckham, hoje, fico com raiva de ter torcido pro Manchester nesse jogo. Mas algo me diz que foi melhor assim.


Será que a revanche de Atenas também ficará na nossa memória?

Um bom começo


E, assim, contra grandes adversidades, a Macaca inicia a série B com o pé direito.

Contra o Gama, vimos Roger ser expulso no primeiro tempo. E vencemos.

Ontem, vimos o Paulista abrir uma vantagem de dois a zero, quase três, também no primeiro tempo. E fomos buscar o empate, lá em Jundiaí.

Ainda falta entrosamento, padrão de jogo, estabilidade. Isso vem com o tempo. Vontade, parece que o time tem de sobra.

18 de maio de 2007

Darwin online

A Folha Online publicou um link fabuloso. As obras completas de Charles Darwin online.

Além de todos os trabalhos de Darwin, correspondências e o escambau, o site ainda traz scans de várias edições das obras. Dá pra sentir o cheiro de livro velho, de passado. Ainda assim, e até mesmo por isso, a iniciativa é muito oportuna. Vivemos um tempo em que professores são instados por diretores de escolas a ensinar a teoria darwiniana lado a lado com a explicação criacionista do mundo. Empregam um relativismo mambembe para justificar a sabotagem de um dos grandes paradigmas científicos do nosso tempo. A teoria de Darwin, dizem, deve ser vista apenas como uma teoria, assim como a teoria criacionista.

Só mesmo quem não faz idéia do que seja uma teoria pra forçar uma interpretação dessas. O primeiro absurdo é elevar ao nível da teoria um conjunto de crenças religiosas. O segundo é pensar que uma teoria é apenas uma teoria, como se teoria fosse igual a ficção ou devaneios sem compromisso com a realidade. Pois tentem realizar uma investigação sem uma teoria! A teoria, oras, dá sentido às observações e experimentações, serve de guia para a investigação científica. Isso é o mínimo de importância que se pode atribuir a ela.

Esse relativismo mambembe está se espalhando pelas escolas e virando slogan. Está minando a compreensão das crianças sobre a ciência. O criacionismo deveria ser ensinado, no máximo, nas aulas de religião - que também são uma excrescência. Se você é pai, procure saber qual é a política da escola no ensino de ciências. E, principalmente, se não ensinam o darwinismo em profundidade, exija que o façam. É seu direito.

E agora eu não tenho mais desculpas pra não ler o livro que mudou o mundo.


Balanço inicial

Com tão pouco tempo de existência, este blog já ultrapassou minhas expectativas. Quando deixei de ensaiar e cliquei no botão "criar blog", imaginava que estaria apenas jogando no vazio a minha tal de "realidade semi-digerida", só pra ter um meio por onde extravasar pensamentos que muitas vezes ficavam contidos. No fundo, eu tinha uma tênue esperança de que alguns amigos e familiares o lessem de vez em quando.

Pois bem, alguns amigos o lêem, realmente. Alguns até mesmo deixam comentários. Uns são velhos amigos, outros mais ou menos recentes e já tão importantes. A vocês todos, muito obrigado, de verdade. Me motivam a escrever mais, e melhor.

Seria bom se tivesse parado por aí. Mas este blog, pra minha completa surpresa, foi recomendado pelo Flávio Gomes, além de cruzar o Atlântico e ter ido parar em Portugal.

Foi uma ótima idéia, essa do blog, viu?

17 de maio de 2007

Pulga (escura) atrás da orelha




A matéria escura não é novidade para a cosmologia. Ela surgiu como hipótese na década de 30. Os modelos cosmológicos e astrofísicos em voga não davam conta de explicar a estrutura e a velocidade das galáxias observadas. Suas características só poderiam ser explicadas pela interação gravitacional com uma matéria que não estava sendo observada. Mais prático e produtivo do que inventar outros modelos, criou-se um argumento ad hoc. Por enquanto, o argumento vem dando certo, e os seus defensores vêm conseguindo até mesmo algumas evidências observacionais indiretas. Para ser justo, cabe lembrar que vêm havendo algumas tentativas (frustradas) de busca por explicações alternativas. É o que vêm dizendo alguns cientistas.

Mais estranha ainda do que a matéria escura é a energia escura. Em estimativas que levam em conta a existência das duas, mais de 75% do nosso universo é formado pela energia escura. Cerca de 20% ficaria com a matéria escura e, pasmem, 4% seria formado da matéria "tradicional", essa que forma estrelas, planetas, gases, corpos de seres humanos e pulgas. Se Carl Sagan estivesse vivo, incluiria esse "fato" nas suas "grandes humilhações": nem mesmo a matéria de que somos feitos é maioria no universo.

No ano passado, participei de um curso de astronomia e astrofísica para leigos, no Observatório Nacional do Rio. Nas várias referências feitas à energia escura, o que ficou para mim é que não sabemos o que ela é, mas precisamos dela para fazer os modelos cosmológicos e astrofísicos funcionarem.

Nessa escura história, não é preciso ser Pedro Pedreira, nem físico, para perceber que ainda há controvérsias.

É claro, não sou físico. Mesmo meu conhecimento básico de física, aquele que obtemos no ensino médio, é quase nulo. Mas posso dizer que sou um espectador da história da ciência. Nela, assistimos a algumas histórias bastante interessantes sobre paradigmas em crise e revoluções científicas. À, talvez, mais espetacular delas, o filósofo da ciência Thomas Kuhn dedicou uma de suas mais célebres obras, A Revolução Copernicana. O caminho percorrido do universo geocêntrico de Aristóteles e Ptolomeu ao universo heliocêntrico de Copérnico passa pelo "pesadelo epicíclico", nas palavras de James Connor, biógrafo do copernicano Kepler.

Uma questão que incomodava alguns astrônomos na época de Copérnico é que o sistema astronômico de Ptolomeu precisava, para explicar os movimentos dos planetas, de cada vez mais recursos que para alguns estavam se tornando artificiais. O universo aristotélico-ptolomaico explicava o movimento dos planetas (e das estrelas “fixas”) por meio de esferas concêntricas. Cada planeta encerrava-se numa esfera própria, e com ela girava em torno da Terra. Acontece que as observações não se encaixavam com esse sistema. Para explicar os movimentos erráticos dos planetas, Ptolomeu teve de construir todo um esquema de deferentes e epiciclos. Os epiciclos descreviam o movimento dos planetas dentro de suas próprias esferas, causando, portanto, sua movimentação única. O problema é que, com a maior quantidade e precisão das observações realizadas, o sistema passava a requerer cada vez mais epiciclos para explicá-las - quase 70, no século XVI. Os epiciclos representavam argumentos ad hoc que visavam a manutenção de um paradigma. Copérnico, embuído das noções de harmonia e simplicidade do neoplatonismo, acabou com o "pesadelo epicíclico" imaginando um universo em que o Sol está no centro e a Terra gira ao redor dele, como os outros planetas, em simples órbitas esféricas.

A matéria e a energia escuras podem existir de fato - é o que as evidências indiretas levam a crer no caso da primeira. Porém, inevitavelmente, elas criaram uma pulga atrás da nossa orelha. E se estivermos passando por uma crise nos paradigmas cosmológicos e astrofísicos? E se estivermos vivendo um outro "pesadelo epicíclico"?

Se a cosmologia está entrando em crise, então me parece que estamos numa encruzilhada: ou encontramos evidências concretas e irrefutáveis sobre a dupla escura, ou abriremos as portas para uma outra grande revolução. E se ela vier, talvez não viveremos para testemunhá-la.

16 de maio de 2007

Aranha domesticada

É estranho o amadurecimento. Os gostos mudam, ficamos mais seletivos, queremos mais significado das coisas. Pelo menos é o que vem acontecendo comigo. Eu não queria assistir a Homem-Aranha 3, mas fui, há alguns dias. Era importante para o meu irmão, Fabrício, que tem quase 13 anos e já é um cinéfilo. Fabrício conhece diretores, atores, produtores, estúdios, quem trabalhou com quem em qual filme, etc. Adora Spielberg e Peter Jackson. E gostou do terceiro Homem-Aranha. Eu odiei, e prometi a mim mesmo não gastar texto pra ficar analisando as inúmeras cretinices do filme. Deterei-me brevemente a uma delas: a condenação cristã da vida em expansão.

Eis O Barco dos Tolos, de Hieronymus Bosch:



Bosch foi um pintor que viveu entre fins do século XV e início do XVI. Sua obra representou um espasmo da moribunda Idade Média enquanto a Renascença emergia. Em suas pinturas há uma evidente condenação dos prazeres terrenos. O que os tolos de Bosch fazem? Comem e bebem, deixam-se levar por Baco e pela música.

O que ocorre com Peter Parker, em Homem-Aranha 3, é a sua descoberta das possibilidades abertas da vida. Peter dança, canta, toca piano, atrai as mulheres, vinga-se de um rival que o prejudicou, regozija-se com o reconhecimento público... Peter Parker vive, em Homem-Aranha 3. E quando começamos a nos divertir com essa nova fase do herói, percebemos aonde o filme quer nos levar. O próprio personagem acaba se arrependendo, salva-se e salva o mundo. Esse é o caminho de Bosch. Mas ainda há algo pior, algo realmente cretino no filme: os impulsos humanos do Aranha são atribuídos a um misterioso ser, um demônio vindo dos céus. Nem mesmo Bosch iria tão longe. Apesar de condená-los, Bosch compreendeu que os impulsos são parte de nossa natureza, que todos nós somos humanos, demasiado humanos.

Para os fãs

Aqui está algo que eu nunca tinha visto: Carl Sagan lendo Pálido Ponto Azul, exatamente a mesma página 31 citada há alguns posts.

15 de maio de 2007

Ire e Voltaire, ironia pura

Você já leu Cândido?

As idéias sobre a distância, tanto física quanto simbólica, que tanto reviraram minha cabeça desde que li Carl Sagan e, mais tarde, Carlo Ginzburg, me levaram de volta a um famoso conto de Voltaire, Micromegas. Dalí, pulei para relembrar de Cândido, o primeiro que havia lido do filósofo iluminista. As pessoas costumam ter receio da leitura de escritos de séculos atrás, pois os imaginam impenetráveis, difíceis, chatos, etc. Isso até pode ser verdade para alguns, mas não para todos. Escritos chatos, difíceis e impenetráveis existiram, existem e, aparentemente, sempre vão existir - que o digam os filósofos pós-modernos. Da mesma forma, bons textos costumam continuar sendo bons textos: perdem-se alguns sentidos, criam-se outros, mas a leitura continua sendo agradável. É o caso de Cândido.

Com relação a Voltaire, meu receio foi vencido graças à dica de um amigo, o historiador Luis Fernando Prestes. Os direitos sobre a piadinha infame do título - Ire e Voltaire, irmãos iluministas lusos - costumam ser pleiteados por ele, mas a ouvi pela primeira vez da boca de outro historiador, um membro do CUH (Central Única dos Historiadores) da Unicamp, o meu ex-professor Fernando Teixeira, impagável humorista de boteco.

Bem, eu estava falando sobre Cândido. As explicações mais difundidas para a alegoria de Cândido é a de que Voltaire fez uma crítica à filosofia otimista e ingênua de Leibniz. Como não li Leibniz, não sei até que ponto a crítica de Voltaire é razoável. De qualquer forma, Voltaire foi um divulgador das idéias newtonianas, e o embate entre a filosofia de Newton e a de Leibniz é bem conhecida. Não é necessário distinguir exatamente a ferida que Voltaire desejava abrir para deliciarmo-nos com a mordacidade com que ataca seu alvo. Mesmo com pouca ou nenhuma preocupação filosófica, Cândido é uma leitura sensacional.

E o melhor de tudo é que não há mais direito autoral sobre obra de Voltaire - é tudo na faixa, como esta versão online de Cândido. É curtinho e engraçadíssimo. Se ainda resta alguma dúvida sobre se vale ou não à pena ler, aqui vai um trecho:


Um dia, em que passeava nas proximidades do Castelo, pelo pequeno bosque a que chamavam parque, Cunegundes viu entre as moitas o Doutor Pangloss que estava dando uma lição de física experimental à camareira de sua mãe, moreninha muito bonita e dócil. Como a Senhora Cunegundes tivesse grande inclinação para as ciências, observou, sem respirar, as repetidas experiências de que foi testemunha; viu com toda a clareza a razão suficiente do Doutor, os efeitos e as causas, e regressou toda agitada e pensativa, cheia do desejo de se tornar sábia, e pensando que bem poderia ela ser a razão suficiente do jovem Cândido, o qual também podia ser a sua.

Encontrou Cândido ao voltar para o Castelo, e enrubesceu; Cândido também corou; ela cumprimentou-o com voz entrecortada, e Cândido falou-lhe sem saber o que dizia. No dia seguinte, depois do jantar, Cunegundes e Cândido encontraram-se atrás de um biombo; Cunegundes deixou cair o lenço, Cândido apanhou-o, ela tomou-lhe inocentemente a mão, o jovem beijou inocentemente a mão da moça com uma vivacidade, uma sensibilidade, uma graça toda especial; suas bocas encontraram-se, seus olhos fulguraram, seus joelhos tremeram, suas mãos perderam-se... Ora, o Senhor Barão de Thunder-ten-tronckh passou junto ao biombo e, vendo aquela causa e aquele efeito, correu Cândido do Castelo, a pontapés no traseiro; Cunegundes desmaiou; logo que voltou a si, foi esbofeteada pela Senhora Baronesa; e houve a maior consternação no mais lindo e mais agradável dos Castelos possíveis.

?

A astronomia e a astronáutica podem ajudar a responder algumas das questões mais profundas que nos atormentam?

Pare. Assista a estes 7 profundos minutos. Assista e pense na sua vida, e em toda vida que pulsa e pulsou neste planeta.

Deveriam mandar filósofos e poetas ao espaço.

Pálido Ponto Azul

A minha inexperiência com blogs me levou a criar um post fantasma, sem título ou texto. Então decidi usá-lo para colocar aqui uma passagem muito conhecida pelos leitores de Carl Sagan. Ela resume a idéia-chave de seu mais belo livro, Pálido Ponto Azul. Carl se refere a esta imagem, captada pela nave Voyager 1 em 1990, a uma distância de mais ou menos 6,5 bilhões de kilômetros:





Sobre a imagem, escreveu Carl:

Olhem de novo para o ponto. É ali. É a nossa casa. Somos nós. Nesse ponto, todos aqueles que amamos, que conhecemos, de quem já ouvimos falar, todos os seres humanos que já existiram, vivem ou viveram as suas vidas. Toda a nossa mistura de alegria e sofrimento, todas as inúmeras religiões, ideologias e doutrinas econômicas, todos os caçadores e saqueadores, heróis e covardes, criadores e destruidores de civilizações, reis e camponeses, jovens casais apaixonados, pais e mães, todas as crianças, todos os inventores e exploradores, professores de moral, políticos corruptos, “superastros”, “líderes supremos”, todos os santos e pecadores da história de nossa espécie, ali - num grão de poeira suspenso num raio de sol.

A Terra é um palco muito pequeno em uma imensa arena cósmica. Pensem nos rios de sangue derramados por todos os generais e imperadores para que, na glória do triunfo, pudessem ser os senhores momentâneos de uma fração desse ponto. Pensem nas crueldades infinitas cometidas pelos habitantes de um canto desse pixel contra os habitantes mal distinguíveis de algum outro canto, em seus freqüentes conflitos, em sua ânsia de recíproca destruição, em seus ódios ardentes.

Nossas atitudes, nossa pretensa importância, a ilusão de que temos urna posição privilegiada no Universo, tudo é posto em dúvida por esse ponto de luz pálida. O nosso planeta é um pontinho solitário na grande escuridão cósmica circundante. Em nossa obscuridade, no meio de toda essa imensidão, não há nenhum indício de que, de algum outro mundo, virá socorro que nos salve de nós mesmos.

A Terra é, até agora, o único mundo conhecido que abriga a vida. Não há nenhum outro lugar, ao menos em futuro próximo, para onde nossa espécie possa migrar. Visitar, sim. Goste-se ou não, no momento a Terra é o nosso posto.

Tem-se dito que a astronomia é uma experiência que forma o caráter e ensina a humildade. Talvez não exista melhor comprovação da loucura das vaidades humanas do que esta distante imagem de nosso mundo minúsculo. Para mim, ela sublinha a responsabilidade de nos relacionarmos mais bondosamente uns com os outros e de preservarmos e amarmos o pálido ponto azul, o único lar que conhecemos.

Grande Sagan. Há muitos anos, mudou radicalmente minha vida.

Último lançamento da Columbia

Do ponto de vista da platéia. Belíssimo. Aos astronautas que perderam suas vidas, tanto nessa quanto em todas as outras missões espaciais da história, muitíssimo obrigado. São heróis.

A quem, como eu, não suporta qualquer tipo de nacionalismo, favor pular os primeiros segundos.

14 de maio de 2007

Supermassive Black Hole

Estou começando a me divertir e aprender sobre essa singularidade do espaço-tempo chamada buraco negro. No site oficial do Hubble, um material didático interativo muito interessante está à disposição de todos.




Glaciers melting in the dead of night
And the superstars sucked into the supermassive
You set my soul alight

Ah, sentimento oceânico...

Lembranças de um eterno brilho mental

Charlie Kaufman, provavelmente, vai iniciar as filmagens de Synecdoche, New York no próximo dia 21. É o primeiro filme em que Kaufman, o brilhante roteirista de Quero Ser John Malkovich, Adaptação e Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças, assume a direção.

Desde que vazaram as primeiras notícias sobre o novo filme, fiquei tentanto imaginar qual vai ser a próxima maluquice de Charlie. Com ele, já caímos dentro da cabeça de John Malkovich, já vimos o filme a que assistíamos ter a ação alterada pelo personagem principal (que, a propósito, era o próprio Charlie), e ainda apelamos à Lacuna, Inc. apagar as memórias da pessoa amada que tanto nos feriu. O que esse cara vai inventar agora? Ao LA Times, ele disse:

"I was thinking about things that are really scary to me, not horror-movie scary, about getting ill and dying, about time moving too quickly as you get older, and not feeling that you've accomplished what you've hoped for. There are issues of enormous relationship nightmares that I was thinking about. Losing his family. Losing the respect of his wife."

O herói, um diretor de teatro moribundo. O cenário, um armazém em que o protagonista tenta encenar uma peça, um simulacro de sua própria vida numa cidade artificial. Sinédoque: um caso especial de metonímia, onde troca-se a palavra que indica o todo de um ser por outra que indica apenas uma parte dele.

Já dá pra sentir o gostinho de uma nova obra-prima.

Frei Galvão



Imagem devidamente surrupiada do
blog do Pedrox

Embasbacante



Dá um bico: agora há pouco descobri a existência da ponte de Millau, na França.

Pra se ter uma idéia, o finado World Trade Center tinha 417 metros de altura. A ponte de Millau tem 343 metros. Uau. Lembrou-me de um certo gigante do futebol brasileiro.

Com vocês, Flávio Gomes

Pra quem gosta de automobilismo, não vou falar nenhuma novidade, o blog do jornalista Flávio Gomes é imperdível. E mesmo quem não gosta de carros de corrida vai esbarrar ocasionalmente em textos de sensibilidade rara e estilo único. Como este post sobre a Stock Car brasileira. Vale à pena acompanhar seus argumentos, mesmo que você nem mesmo saiba que raios é a Stock. Se estiver com preguiça, um excerto:

Antes de mais nada, deixo claro um ponto que considero essencial: o fato de eu não gostar da Stock pelos motivos que vou expor não significa que não reconheça sua existência e, vá lá, importância. Eu não gosto de um monte de coisa. Quiabo, por exemplo. Mas há quem goste. Quiabos são importantes, certamente. Não gosto de Toyota Corolla, outro exemplo. Mas como poderia deixar de reconhecer que é um carro que vende, e que tem quem compre? Não gosto da “Veja”, mais um exemplo. Acho-a desprezível do ponto de vista jornalístico e ético. Mas não posso desprezar sua relevância, lida que é por sei lá quantos milhões de tontos. Forma milhões de tontos. Tem relevância. Não gosto do Corinthians e do São Paulo. Mas eles existem, e adoro quando minha Portuguesa ensaca ambos (ano que vem está aí).

Melhor do que essa passagem, só mesmo quando escreveu com todas as letras o quanto Reinaldo Azevedo era um filho-da-puta. Pra quem não sabe, Azevedo é um tonto que escreve na Veja, para outros tontos.

Aplausos, Gomes!

Massa na cabeça!

E não é que o Massa tá dando a volta por cima bem rápido? Peitou um Alonso em casa e ainda fez o seu segundo hat-trick seguido (pole, vitória e volta mais rápida). Hamilton, incrivelmente, é líder do campeonato. Kimi manteve a antiga tradição e Rubens chegou em péssimo.

Sim, há uma diferença abissal entre a atual posição dominante de Massa na Ferrari frente ao papel de capacho vivido por Rubinho. Mas para aqueles que se apressam em escarnecer de Barrichello, cabe lembrar o óbvio: o Queixudo-mor não está mais por lá. Guiar contra o piloto mais azarado do mundo não é exatamente a mesma coisa do que guiar contra o melhor (durante anos a fio, no caso do coitado do Rubens).

Fora isso, a corrida foi aquela coisa maravilhosa que tanto caracteriza essa pistinha catalã: uma procissão sem fim.

Aliás, procissão sem fim vem bem a calhar com o que ocorreu nesse domingo. A transmissão da procissão de Barcelona não terminou graças à procissão do senhor Joseph Ratzinger e à gloriosa Rede Globo. Foi tarde, o papa. E bem que ele poderia ter levado o Galvão Bueno junto.

Finally

Depois de mais uma provação no mundo da informática, finalmente estou com a minha máquina da NASA pronta pra voar. Um jumper no lugar errado quase me levou à loucura. Mas acabou o calvário, espero. Agora espero poder me dedicar a este blog de modo mais satisfatório.

Meus milhões de leitores agradecem.

9 de maio de 2007

Dia 9

Hoje é dia 9 de maio.

Dia 9.

Todo dia 9 deveria ser comemorado.

Esse dia 9 deveria ser comemorado.

Por que eu não quis? Por quê?

Sobre caixas




Assim como quando eu tinha 7 anos de idade, estou com uma caixa de tamanho considerável no colo, louco pra abrí-la e ver o que tem dentro, mesmo que eu já saiba o que é.


Lembro-me vividamente daquele natal de 1987. Lembro com precisão o ano pois, na infância, adotei um método pra apreender a passagem dos anos: a observação dos modelos guiados por Ayrton Senna. Naquele ano, não esqueço, Senna pilotava a Lotus 99T toda amarela, patrocinada pela Camel. Naquele carro, eu vi Senna quase vencer Piquet na Williams, em Monza, sem parar para trocar pneus. Senna pagou um preço alto pela ousadia com uma escapada na Parabólica, no finzinho, que tirou-lhe a vitória. Mas foram coisas como essas que arrebataram milhões. Ali estava alguém para quem valia muito à pena torcer, pensei.


Bem, eu disse que lembrava-me vividamente daquele natal de 1987. Estávamos todos na casa do meu tio, perto da meia-noite. As crianças estavam ganhando seus presentes e eu estava com o coração na boca: ganharia ou não ganharia o Colossus? A expectativa não durou muito, e meu pai colocou aquela caixa quase do meu tamanho no meu colo, uma caixa que eu vinha observando aquela noite inteira, suspeitando que fosse o carro. Quer dizer, eu tinha quase certeza de que era o carro.


Era ele, claro.


Agora estou com essa caixa aqui. Pela primeira vez em muitos anos terei um computador decente pra usar. Obrigado, Tê!



3 de maio de 2007

Maio: problemas no PC

As postagens de maio começarão atrasadas, mas em breve, devido a problemas infindáveis no meu querido computador (mais precisamente, num HD bichado e numa placa-mãe temperamental).

Reestréia em breve!

De onde você vem?