Deu ontem na Folha Online: Hubble dá evidência inesperada de matéria-fantasma no Universo.
A matéria escura não é novidade para a cosmologia. Ela surgiu como hipótese na década de 30. Os modelos cosmológicos e astrofísicos em voga não davam conta de explicar a estrutura e a velocidade das galáxias observadas. Suas características só poderiam ser explicadas pela interação gravitacional com uma matéria que não estava sendo observada. Mais prático e produtivo do que inventar outros modelos, criou-se um argumento ad hoc. Por enquanto, o argumento vem dando certo, e os seus defensores vêm conseguindo até mesmo algumas evidências observacionais indiretas. Para ser justo, cabe lembrar que vêm havendo algumas tentativas (frustradas) de busca por explicações alternativas. É o que vêm dizendo alguns cientistas.
Mais estranha ainda do que a matéria escura é a energia escura. Em estimativas que levam em conta a existência das duas, mais de 75% do nosso universo é formado pela energia escura. Cerca de 20% ficaria com a matéria escura e, pasmem, 4% seria formado da matéria "tradicional", essa que forma estrelas, planetas, gases, corpos de seres humanos e pulgas. Se Carl Sagan estivesse vivo, incluiria esse "fato" nas suas "grandes humilhações": nem mesmo a matéria de que somos feitos é maioria no universo.
No ano passado, participei de um curso de astronomia e astrofísica para leigos, no Observatório Nacional do Rio. Nas várias referências feitas à energia escura, o que ficou para mim é que não sabemos o que ela é, mas precisamos dela para fazer os modelos cosmológicos e astrofísicos funcionarem.
Nessa escura história, não é preciso ser Pedro Pedreira, nem físico, para perceber que ainda há controvérsias.
É claro, não sou físico. Mesmo meu conhecimento básico de física, aquele que obtemos no ensino médio, é quase nulo. Mas posso dizer que sou um espectador da história da ciência. Nela, assistimos a algumas histórias bastante interessantes sobre paradigmas em crise e revoluções científicas. À, talvez, mais espetacular delas, o filósofo da ciência Thomas Kuhn dedicou uma de suas mais célebres obras, A Revolução Copernicana. O caminho percorrido do universo geocêntrico de Aristóteles e Ptolomeu ao universo heliocêntrico de Copérnico passa pelo "pesadelo epicíclico", nas palavras de James Connor, biógrafo do copernicano Kepler.
Uma questão que incomodava alguns astrônomos na época de Copérnico é que o sistema astronômico de Ptolomeu precisava, para explicar os movimentos dos planetas, de cada vez mais recursos que para alguns estavam se tornando artificiais. O universo aristotélico-ptolomaico explicava o movimento dos planetas (e das estrelas “fixas”) por meio de esferas concêntricas. Cada planeta encerrava-se numa esfera própria, e com ela girava em torno da Terra. Acontece que as observações não se encaixavam com esse sistema. Para explicar os movimentos erráticos dos planetas, Ptolomeu teve de construir todo um esquema de deferentes e epiciclos. Os epiciclos descreviam o movimento dos planetas dentro de suas próprias esferas, causando, portanto, sua movimentação única. O problema é que, com a maior quantidade e precisão das observações realizadas, o sistema passava a requerer cada vez mais epiciclos para explicá-las - quase 70, no século XVI. Os epiciclos representavam argumentos ad hoc que visavam a manutenção de um paradigma. Copérnico, embuído das noções de harmonia e simplicidade do neoplatonismo, acabou com o "pesadelo epicíclico" imaginando um universo em que o Sol está no centro e a Terra gira ao redor dele, como os outros planetas, em simples órbitas esféricas.
A matéria e a energia escuras podem existir de fato - é o que as evidências indiretas levam a crer no caso da primeira. Porém, inevitavelmente, elas criaram uma pulga atrás da nossa orelha. E se estivermos passando por uma crise nos paradigmas cosmológicos e astrofísicos? E se estivermos vivendo um outro "pesadelo epicíclico"?
Se a cosmologia está entrando em crise, então me parece que estamos numa encruzilhada: ou encontramos evidências concretas e irrefutáveis sobre a dupla escura, ou abriremos as portas para uma outra grande revolução. E se ela vier, talvez não viveremos para testemunhá-la.
Mais estranha ainda do que a matéria escura é a energia escura. Em estimativas que levam em conta a existência das duas, mais de 75% do nosso universo é formado pela energia escura. Cerca de 20% ficaria com a matéria escura e, pasmem, 4% seria formado da matéria "tradicional", essa que forma estrelas, planetas, gases, corpos de seres humanos e pulgas. Se Carl Sagan estivesse vivo, incluiria esse "fato" nas suas "grandes humilhações": nem mesmo a matéria de que somos feitos é maioria no universo.
No ano passado, participei de um curso de astronomia e astrofísica para leigos, no Observatório Nacional do Rio. Nas várias referências feitas à energia escura, o que ficou para mim é que não sabemos o que ela é, mas precisamos dela para fazer os modelos cosmológicos e astrofísicos funcionarem.
Nessa escura história, não é preciso ser Pedro Pedreira, nem físico, para perceber que ainda há controvérsias.
É claro, não sou físico. Mesmo meu conhecimento básico de física, aquele que obtemos no ensino médio, é quase nulo. Mas posso dizer que sou um espectador da história da ciência. Nela, assistimos a algumas histórias bastante interessantes sobre paradigmas em crise e revoluções científicas. À, talvez, mais espetacular delas, o filósofo da ciência Thomas Kuhn dedicou uma de suas mais célebres obras, A Revolução Copernicana. O caminho percorrido do universo geocêntrico de Aristóteles e Ptolomeu ao universo heliocêntrico de Copérnico passa pelo "pesadelo epicíclico", nas palavras de James Connor, biógrafo do copernicano Kepler.
Uma questão que incomodava alguns astrônomos na época de Copérnico é que o sistema astronômico de Ptolomeu precisava, para explicar os movimentos dos planetas, de cada vez mais recursos que para alguns estavam se tornando artificiais. O universo aristotélico-ptolomaico explicava o movimento dos planetas (e das estrelas “fixas”) por meio de esferas concêntricas. Cada planeta encerrava-se numa esfera própria, e com ela girava em torno da Terra. Acontece que as observações não se encaixavam com esse sistema. Para explicar os movimentos erráticos dos planetas, Ptolomeu teve de construir todo um esquema de deferentes e epiciclos. Os epiciclos descreviam o movimento dos planetas dentro de suas próprias esferas, causando, portanto, sua movimentação única. O problema é que, com a maior quantidade e precisão das observações realizadas, o sistema passava a requerer cada vez mais epiciclos para explicá-las - quase 70, no século XVI. Os epiciclos representavam argumentos ad hoc que visavam a manutenção de um paradigma. Copérnico, embuído das noções de harmonia e simplicidade do neoplatonismo, acabou com o "pesadelo epicíclico" imaginando um universo em que o Sol está no centro e a Terra gira ao redor dele, como os outros planetas, em simples órbitas esféricas.
A matéria e a energia escuras podem existir de fato - é o que as evidências indiretas levam a crer no caso da primeira. Porém, inevitavelmente, elas criaram uma pulga atrás da nossa orelha. E se estivermos passando por uma crise nos paradigmas cosmológicos e astrofísicos? E se estivermos vivendo um outro "pesadelo epicíclico"?
Se a cosmologia está entrando em crise, então me parece que estamos numa encruzilhada: ou encontramos evidências concretas e irrefutáveis sobre a dupla escura, ou abriremos as portas para uma outra grande revolução. E se ela vier, talvez não viveremos para testemunhá-la.
5 comentários:
Interessante, amigo Danilo. Já agora, acerca do "Pálido Ponto Azul", aproveitei e escrevi um posto no meu blog acerca disso. Acho que os meus compatriotas tamém têm que conhecer este belo artigo...
A nave Event Horizon está intrigada com esta notícia!
“ nem mesmo a matéria de que somos feitos é maioria no universo...”
Pensei que um indivíduo torcedor da Ponte Preta já estivesse acostumado a ser minoria.hahahahahaha
Koshimizu, a Event Horizon é autora de uma frase que pode muito bem se referir ao meu querido clube do coração:
"Hell is just a word. The reality is much, much worse"
Eu acho que esta frase é mais adequada para os torcedores do teu time:
" Liberate vos ex inferis"
Seu japa lazarento, esse filme impactou tanto você quanto eu. Assistimos juntos.
Ó, vou te dizer uma coisa. Os corintianos, esse ano, têm que rezar o que seguinte:
"Liberate me ex segundum divisium"
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